Publicado em: 02/06/2025
Sem internet e empresas falidas: o impacto dos ataques a provedores no Ceará
O Ceará vive uma escalada preocupante da violência ligada ao crime organizado, com reflexos diretos na vida da população e na economia local. Nos últimos meses, ataques coordenados pelo Comando Vermelho, com ordens partindo de integrantes escondidos na comunidade da Rocinha, no Rio de Janeiro, provocaram o fechamento de empresas de internet e deixaram milhares de moradores sem acesso a serviços básicos.
Criminosos foragidos e operação policial
Na manhã do último sábado (31), uma operação conjunta foi deflagrada na Rocinha, Zona Sul do Rio, para capturar líderes da facção criminosa responsáveis por ordenar os ataques no Ceará. A ação resultou no cumprimento de 29 mandados de prisão e 14 de busca e apreensão. Apesar do forte aparato policial, nenhuma das lideranças do Comando Vermelho foi capturada. Segundo o apurado, os criminosos conseguiram fugir pela mata logo no início da operação.
Durante a ação, foram apreendidos quatro fuzis, duas pistolas, um revólver, um fuzil de airsoft, munições e drogas ainda em processo de contabilização. Um homem com mandado de prisão em aberto foi detido.
Ataques coordenados contra provedores
Entre fevereiro e março deste ano, criminosos realizaram uma série de ataques contra empresas de internet em Fortaleza, Caucaia, São Gonçalo do Amarante e Caridade. As ações incluíram incêndios de veículos, destruição de antenas, caixas de transmissão, equipamentos e redes de fibra ótica. Em um dos casos, criminosos invadiram a sede da empresa e vandalizaram completamente a infraestrutura.
De acordo com investigações do Ministério Público do Ceará, os ataques ocorreram como represália à recusa dos empresários em pagar uma taxa mensal imposta pelo Comando Vermelho — R$ 20 por cliente ativo. Essa cobrança extorsiva transformou-se em uma ameaça real à estabilidade das empresas do setor.
Consequências para a população
O impacto sobre a população foi imediato e devastador. O município de Caridade, localizado a cerca de 92 quilômetros de Fortaleza, foi um dos mais atingidos. Cerca de 90% dos usuários ficaram sem internet por semanas, segundo estimativas da Associação de Provedores do Ceará. Apenas os que tinham serviços via satélite conseguiram manter a conexão.
Com a ausência de internet, milhares de moradores da cidade — com população estimada em 22,5 mil pessoas — ficaram sem acesso a serviços bancários, transferências via Pix, inscrições em concursos públicos e outras atividades essenciais do dia a dia. A exclusão digital forçada escancarou a fragilidade da conectividade em regiões dependentes de pequenos e médios provedores.
Empresas encerram atividades
Além dos danos à população, os ataques causaram o fechamento de ao menos duas empresas do setor. Uma das vítimas foi a GPX Telecom, localizada em Caucaia. Após ser alvo de criminosos, a empresa anunciou o encerramento das operações em março.
"Em menos de 20 minutos, atos de vandalismo devastaram tudo o que construímos com tanto esforço e comprometimento, levando-nos a tomar a difícil decisão de encerrar nossas operações", declarou a empresa em nota pública. A GPX atendia centenas de clientes e gerava empregos diretos na região.
Cenário de tensão e insegurança
A situação atual expõe não apenas a vulnerabilidade das empresas locais diante do avanço do crime organizado, mas também a urgência de políticas públicas e ações de segurança mais efetivas. O Ministério Público do Ceará atribui ao grupo criminoso mais de mil homicídios no estado, um número que acende o alerta para o grau de articulação e poder da facção.
O colapso de serviços essenciais e o fechamento de empresas mostram que o impacto vai além das estatísticas de violência — ele atinge diretamente a dignidade e o direito à comunicação de milhares de cearenses.